São 10 anos que Santa Cruz não conhece uma eleição municipal sem alguma ação a ser movida contra os eleitos para comandar o poder executivo. A ação de cassação contra Fernanda Costa foi a maior dos últimos tempos no Rio Grande do Norte, e configura também a maior ação na história da cidade.
Uma das primeiras ações eleitorais que pediam cassação dos eleitos na história recente de Santa Cruz foi em 2008, na eleição que Péricles Rocha enfrentou Petrônio Spinelli. Naquela eleição, um a ação investigou a prática de captação ilícita de votos, baseada em cartas com pedidos diversos de eleitores e R$ 9.600,00 em dinheiro, encontrados pelo juiz da 16ª Zona Eleitoral em maleta de propriedade de “Tomba”, no dia da eleição.
Em julho de 2009, Péricles Rocha, na época filiado ao PSDB, foi cassado em decisão tomada pelo juiz Flávio Ricardo Pires de Amorim, da cidade de Tangará. Além dele, o vice-prefeito Joca Ferreira também foi cassado. O presidente da Câmara Municipal, Josemar Bezerra, foi intimado para assumir interinamente a Prefeitura Municipal, mas não foi encontrado e a cidade ficou sem prefeito por algumas horas. O juiz Roberto Guedes determinou, em caráter liminar, a permanência da chapa até a decisão final do TRE/RN.
ABSOLVIÇÃO DE PÉRICLES
A Procuradoria Regional Eleitoral no Rio Grande do Norte (PRE/RN) na época emitiu parecer pela não cassação de José Péricles Farias da Rocha e João Olímpio Maia Ferreira de Souza (Joca Ferreira). Para a PRE/RN, a decisão que cassou o mandato dos candidatos deve ser reformada, pois não há provas suficientes que caracterize a compra de votos atribuída a eles.
O procurador regional eleitoral substituto, Ronaldo Sérgio Chaves Fernandes, concordou com os argumentos do recurso, uma vez que não há testemunhas ou prova documental demonstrando o oferecimento, a doação, a promessa, ou entrega de vantagem com intuito eleitoreiro. Diante da fragilidade das provas, o procurador considerou que a sentença condenatória deve ser reformada, afastando as penalidades aplicadas, pois ressalta que “não se pode reputar praticada a compra de votos, por maiores que sejam os indícios de sua futura ocorrência”.
Péricles Rocha depois teve a confirmação no TRE/RN e no TSE de sua absolvição nessa ação eleitoral.
PÉRICLES X FERNANDA
Outra Ação de Investigação Judicial Eleitoral que foi movida na eleição seguinte, em Santa Cruz, foi contra Fernanda Costa e Joca Ferreira, além dos candidatos a vereador Ana Fabrícia e Tarcísio Reinaldo. Os quatro foram acusados de infringirem a legislação eleitoral na Festa das Personalidades de 2012, realizada no Trairi Clube.
A denúncia foi assinada pelos advogados Felipe Cortez e Esequias Pegado Cortez Neto, que representam a coligação “Santa Cruz da Gente”, de Péricles Rocha, agora já filiado ao PSD, e o vice Marcos Lima (PTB). Na época, foi colocado que os acusados “receberam destaque dentre os demais homenageados presentes, evidenciando a sua condição de candidatos e desigualando a disputa eleitoral perante a nata formadora de opinião da sociedade santa-cruzense”.
A ação não prosperou e Fernanda Costa concluiu seu primeiro mandato, em 2016, e foi reeleita.
A FARMÁCIA DA DISCÓRDIA
Em 2016, às vésperas das eleições, a Polícia Federal apreendeu documentos na Farmácia Droga Center, em cumprimento ao mandado de busca e apreensão autorizada judicialmente, com apoio do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco).
De acordo com os autos, “a denúncia assinada pelo Sr. Arilson Medeiros de Araújo”, esposo da candidata da adversária, Gilcelly Adriano, “que descreve de forma detalhada o funcionamento de supostos ‘esquemas’ de distribuição de medicamentos e combustível ao eleitorado, através dos vereadores e lideranças do grupo político da Prefeita Fernanda Costa Bezerra, utilizando-se para tanto de recursos públicos oriundo da Prefeitura Municipal”.
Os cadernos de capa amarela e verde, além de envelopes e outros documentos foram apreendidos e fizeram parte das provas que continham nomes como: Aninha de Cleide, Tarcísio Reinaldo, Mário Farias, Monik Melo, Gilcelly Adriano, Raimundo Fernandes, Genaro Filho, Marcela Ravena, Geisa Ferreira, Acrísio Gomes, Sérgio Magno, Milena Bulhões e outros.
DELAÇÕES
A funcionária Lígia Cristina Cavalcante da Silva foi fundamental em seu depoimento para esquematizar esses detalhes para ação eleitoral que cassou Fernanda Costa. Nos autos consta que ela “trabalhou na Farmácia Drogacenter, de 2009 à 2017, portanto no período dos fatos discutidos. Era funcionária de confiança, realizando atividades restritas a ela e aos proprietários, tendo acesso e atribuição de ‘tirar todas as notas fiscais eletrônicas da farmácia, incluindo as da Prefeitura, incineração e devolução de medicamentos;'”. O depoimento revelava uma cota mensal de R$ 900,00, podendo acumular créditos para os meses seguintes, caso não fosse utilizado totalmente.
OPOSIÇÃO NA COTA
Os autos mostram que Gilcelly Adriano fazia parte dessas cotas, tanto que seu nome aparece nos registros, no entanto sua participação vai até abril de 2016, ano da eleição, e anterior ao rompimento dela com o sistema governista de Fernanda Costa.
DELAÇÃO DA OPOSIÇÃO
Na matéria do TJRN, as informações foram de que as provas pelas quais o MPRN ajuizou ação penal foram obtidas em ação deferida por juízo eleitoral que apurava abuso de poder na eleição de 2016 em contratos mantidos com uma farmácia e um posto de combustíveis de Santa Cruz. Tomba e sua esposa possuem prerrogativa de foro no Tribunal de Justiça, único que poderia ter autorizado ação de busca e apreensão para sustentar investigação sobre ambos.
No julgamento, restou o entendimento que é preciso o respeito ao regramento jurídico e que não podem ser admitidas provas colhidas de forma ilegal para consecução penal. Os elementos, no entanto, seguem válidos para ação eleitoral.
Por outro lado, o Tribunal de Justiça recusou o pedido para nulidade do acordo de delação premiada firmada entre Gilcelly Adriano Medeiros de Araújo e Arílson Medeiros de Araújo com o MP. A contribuição que ambos deram são utilizadas para outras investigações.
CASSAÇÃO
No dia 27 de novembro de 2018, o pleno do TRE/RN, com a relatoria do juiz Wlademir Capistrano, cassou a prefeita Fernanda Costa, seu companheiro de chapa, Ivanildinho Ferreira, além dos vereadores Aninha de Cleide, Monik Melo, Mário Farias, Raimundo Fernandes, Tarcísio Reinaldo e Thiago Fonseca.
TODOS ELEITOS QUESTIONADOS
Péricles Rocha foi vencedor de 2008, teve questionamento sobre uma mala de dinheiro, gerou uma ação eleitoral. Já em 2012, foi Fernanda Costa a eleita, mas também sofreu com uma ação eleitoral.
Agora, em 2018, a cidade enfrenta um resultado de uma ação eleitoral, resultante de 2016, que pediu a cassação da eleita Fernanda Costa.
Ou seja, os últimos três eleitos tiveram suas vitórias questionadas na justiça eleitoral.
A judicialização das campanhas eleitorais em Santa Cruz parece ser um caminho viável para os grupos políticos. O chamado “tapetão” é uma opção para enfrentar a derrota ou ainda a compra de votos, seja ela comprovada ou não.